Resident Evil Village

Até onde você iria para salvar uma pessoa que ama? Esta é uma pergunta que pode parecer fácil de ser respondida, mas enquanto jogava o Resident Evil Village, ela teimava em permanecer na minha cabeça. No caso de Ethan Winters, ele estava disposto a arriscar a própria vida para encontrar a filha, mas durante uma viagem que o levará rapidamente do céu ao inferno, ele perceberá que existem coisas que podem ser muito piores do que a morte.

Passando três meses após os eventos mostrados no Resident Evil 7: Biohazard, Ethan e sua esposa estão vivendo em paz com sua recém nascida filha, quando numa noite um evento trágico faz o mundo do protagonista (novamente) virar de cabeça para baixo. Sem querer entrar em detalhes sobre o evento, saiba que ele colocará Ethan no meio de uma pequena vila europeia, um lugar que parece ter parado no tempo e onde ele descobrirá que o terror está de volta.

Pois é justamente o terror o ponto alto do Resident Evil Village, pois se no seu antecessor tínhamos uma experiência mais intimista, com a casa dos Bakers passando uma terrível sensação de claustrofobia, aqui tudo será maior, mais imponente e de certo forma, aterrorizante. Logo nos primeiros minutos naquele lugar ficará claro como estamos vulneráveis e a saída será batermos em retirada, recuperarmos o fôlego e torcer para encontrarmos alguma ajuda.

Será também no início da dolorosa saga de Ethan Winters que perceberemos que, se na história anterior o foco estava quase que completamente no horror, aqui veremos uma quantidade muito maior de ação, lembrando a direção que a desenvolvedora tomou com o Resident Evil 4. Ou seja, se naquela assustadora residência localizada na Louisiana o jogo tentava nos aterrorizar mais com a sua pesada atmosfera, neste teremos altas descargas de adrenalina pelo simples fato de sabermos que na maioria das vezes somos uma presa fácil.

Esta mudança de estilo não deverá agradar a todos, mas para uma série que evoluiu, experimentou e se adaptou tantas vezes, não deverá ser um problema para quem desde o primeiro capítulo tem acompanhado estas metamorfoses. Particularmente, sempre me agrada mais o estilo terror psicológico, onde uma obra vai criando um clima para nos manter tensos, mas mesmo assim gostei muito da “alta octanagem” entregue com Village.

O grande problema é que ao impor tal mudança e manter os controles do antecessor, a Capcom acabou entregando um jogo de ação onde a jogabilidade parece muito arrastada. Com o nosso personagem se movendo muito lentamente (mesmo quando está correndo), eles tiveram que ajustar a velocidade dos inimigos e assim eles estão sempre avançando na nossa direção num ritmo desacelerado, quase sempre servindo como meros alvos num estande de tiro.

Isso se dá muito por causa da câmera escolhida pelos desenvolvedores, novamente em primeira pessoa. Sim, grande parte da tensão passada pelo Resident Evil Village se deve a ela, com o nosso campo de visão sendo bastante restrito, mas sempre que ele se transforma num jogo de tiro (o que é bastante comum), a agilidade do personagem acaba sendo um ponto negativo, principalmente nas batalhas contra os chefes.

O quarteto fantástico bizarro

Durante toda a campanha seremos apresentados a diversos seres assustadores, de mutantes parecidos com lobisomens a musculosos humanos que atuam como soldados modificados. Porém, nada supera os quatro lordes que servem a grande vilã da história, a Mãe Miranda. Contando com poderes e personalidades distintas, esses personagens também servem para dividir o Resident Evil Village em quatro áreas e uma sábia decisão tomada pela Capcom foi fazer com que cada uma delas tivesse um ritmo ligeiramente diferente da anterior.

No caso da popular Alcina Dimitrescu, seu castelo passa a clara impressão de estarmos vasculhando a mansão do primeiro Resident Evil, com diversos quebra-cabeças testando a nossa inteligência e o seu calabouço contando com mortos-vivos que agem de maneira parecida com os daquele jogo. Mesmo o comportamento da imensa mulher parece ter sido inspirado em outro ponto da série, com ela nos perseguindo incansavelmente pelo lugar, assim como fazia o Nemesis.

Resident Evil Village

Já ao chegarmos na Casa Beneviento, o título se transformará numa espécie de jogo de gato e rato, com Ethan estando mais vulnerável do que nunca e o nível de pavor alcançando um nível absurdo. Essa obviamente foi a minha parte preferida do Village, com a anfitriã sendo facilmente a mais assustadora de toda a aventura e mesmo ainda tendo pesadelos com aquela coisa que se arrasta pela escuridão, no final lamentei por aquele “trem fantasma” ter chegado ao fim da viagem tão rápido.

Teremos ainda a visita a uma represa, com o deformado sujeito que toma conta do lugar não tendo conseguido assustar tanto quanto a mulher das bonecas, mas com o desolado cenário da sua morada tendo impressionado pela beleza. Esta foi certamente a fase, se é que podemos chamar assim, que menos me causou medo, sendo praticamente um passeio no parque quando comparada ao resto da campanha.

Por fim, teremos ainda que encarar a fábrica de Heisenberg e aqui novamente seremos perseguidos por seres bastante poderosos. Eu gostei da ambientação, mas novamente senti falta de quebra-cabeças e fiquei um pouco decepcionado por termos apenas que ir de um ponto a outro para pegar um item e assim poder dar continuidade à progressão.

A excelência técnica

Assim como aconteceu no capítulo anterior, Resident Evil Village é um jogo visualmente impressionante. Na maior parte das vezes os personagens possuem um nível de animação muito bom e tirando a esposa do Ethan, que me parece um tanto artificial, os rostos conseguem passar a impressão de serem pessoas reais.

Este realismo também está presente em quase todos os cenários, com o castelo Dimitrescu parecendo tão imponente quanto deveria ser; as bonecas de Donna Beneviento sendo assustadoramente horríveis; ou o lugar em que Heisenberg cria seu exército sendo bastante opressor. Das texturas em alta resolução aos efeitos de iluminação que mudam de acordo com a hora do dia, novamente a RE Engine mostra seu poder e o jogo serve como uma bela amostra do que a nova geração de consoles poderá nos oferecer.

Contudo, se tem uma área que podemos considerar perfeita no jogo é a engenharia de som. Fazendo com que diversas passagens se tornem ainda mais assustadoras, graças a ela podemos notar até a mudança na respiração do protagonista de acordo com a situação pela qual estiver passando. São barulhos que acontecem numa direção em que não estamos olhando, grunhindo terríveis sendo feito há distância, dicas sutis de algo está se aproximando, enfim, um trabalho primoroso da Capcom e que faz com que a atmosfera seja tão fantástica quanto assustadora. Por tudo isso, torna-se praticamente obrigatório encarar o Resident Evil Village usando um bom fone de ouvido, ou pelo menos um sistema de áudio 5.1.

Uma viagem e tanto

Mesmo possuindo alguns pontos que podem ser melhorados em futuros lançamentos e com a sua história parecendo um tanto desconexa da ideia de uma super corporação responsável por causar o apocalipse zumbi, Resident Evil Village é um jogo fantástico, capaz de entregar uma dose de terror e outra de ação na medida certa. Sua campanha principal não é muito longa, podendo ser terminada em cerca de 10 horas, mas devido a intensidade do que vivemos nela, não acho que isso seja um problema.

E por mais que o enredo não seja brilhante, foi muito bacana conhecer melhor o grupo de vilões criados para este capítulo e a satisfação que senti ao vê-los derrotados reforçou a minha opinião sobre como eles foram bem criados. Só é uma pena que a parte final (principalmente depois da fábrica) não esteja a altura do restante, dando até a impressão de que caímos em outro jogo, um que se comporta ainda mais como um FPS.

Quanto a pergunta que fiz no início desta análise, não tenho dúvida de que eu estaria disposto a ir até o fim do mundo para proteger aqueles que amo, mas depois de encarar o Resident Evil Village, só espero que no caminho eu não precise ter que passar pela Casa Beneviento, porque sinceramente, para tudo há limite.

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Pai em tempo integral do pequeno Nicolas, enquanto se divide escrevendo para o Meio Bit Games e Vida de Gamer, tenta encontrar um tempinho para aproveitar algumas das suas paixões, os filmes, os quadrinhos, o futebol e os videogames. Acredita que um dia conseguirá jogar todos os games da sua coleção.