Os Fliperamas no Brasil
Para falar sobre os fliperamas no Brasil, é imprescindível tratarmos antes da empresa que nos apresentou a esse universo, a Taito. Fundada no Japão em 1953, a própria história do seu fundador, Michael Kogan, já é bastante fascinante.
Nascido em Odesa, Ucrânia, Michael “Misha” Kogan e sua família fugiram da União Soviética para a China devido à Revolução Russa e, pouco antes da Segunda Guerra Mundial, eles se estabeleceram no Japão. Foi então que em 1953, em Tóquio, após uma investida fracassada no ramo de distribuição de roupas, o empreendedor iniciou a Taito Trading Company.
A empresa atuava importando vodca, além de distribuir máquinas de vendas e jukeboxes, até que eventualmente começou a produzir seus próprios equipamentos. Na década de 60 eles se arriscaram no mercado de pinballs e em 1973 lançaram seu primeiro jogo, um clone do Pong chamado Elepong, quando mudou seu nome para Taito Corporation.
Mas antes mesmo disso e até antes de desembarcar nos Estados Unidos, em 1968 a Taito já dava seus primeiros passos no Brasil, onde ficou conhecida como Trevo Diversões Eletrônicas. Devido à reserva de mercado existente por aqui, a empresa precisou se estabelecer como uma companhia nacional, esperar alguns anos e só depois abrir uma sociedade com a divisão internacional.
No início, o foco daquela empreitada estava em importar máquinas de pinball e componentes para que fossem montadas no país. Desta forma suas posteriores distribuição e comercialização se tornaram possíveis, operações essas que ficaram sob a responsabilidade de Abraham “Abba” Kogan, filho de Michael.
O desempenho da Taito do Brasil foi tão forte que em 1982 a divisão da empresa registrou o maior faturamento do mundo, chegando a empregar 500 funcionários. Isso se deu principalmente pela produção local de máquinas de pinball, com a empresa se vendo obrigada a produzir clones dos jogos criados no exterior para se adequar a uma cada vez mais rigorosa reserva de mercado imposta pelo governo.
Dentre as produções brasileiras, as duas mais conhecidas foram a Cavaleiro Negro, baseada no jogo Black Knight, da Williams, e a Oba Oba, que usava a imagem da casa de shows de Oswaldo Sargentelli e buscou “inspiração” na máquina Playboy, da Bally. Outras que fizeram sucesso foram a Rally, a Vortez e a Zarza.
Mas a Taito do Brasil não se limitou a importar ou produzir apenas máquinas de pinball. Com o avanço da tecnologia, os jogos eletrônicos eventualmente se tornariam bastante populares e a empresa precisaria adentrar neste mercado. O problema é que a reserva de mercado continuava e sem a tecnologia para criar seus fliperamas, ela novamente recorreu ao “jeitinho brasileiro”.
A saída foi adotar uma técnica conhecida como bootleg, que se trata de aproveitar uma placa — mais barata e acessível — para rodar jogos que originalmente não foram criados para ela. Essas modificações tinham como base o jogo Moon Cresta, que havia sido licenciado pela Taito do Japão e por ser montado com o popular processador Z80, permitia que muitos títulos fossem adaptados para ele.
Aquela facilidade de adaptação permitiu que os profissionais da Taito do Brasil trouxessem para o público daqui versões localizadas de jogos que faziam muito sucesso lá fora, como Super Cobra ou Donkey Kong e assim, criava-se uma geração de jogadores de arcades.
Mas se desde 2005 a Taito existe apenas como uma marca, após ter sido adquirida pela Square Enix, no Brasil seus momentos finais aconteceram 20 anos antes, quando a companhia foi dividida entre a Divertronics e a Mecatronics. Alguns meses depois, Abraham Kogan passaria por um acontecimento traumático que o faria deixar o país.
O caso foi relatado na edição de 21 de agosto de 1986 do jornal O Estado de São Paulo. A matéria assinada pelo jornalista Renato Lombardi começa da seguinte maneira:
“A extorsão de Cz$ 7,5 milhões contra o industrial Abraham Kogan, proprietário da Thaito do Brasil e de outras duas empresas de máquinas eletrônicas, provocou ontem à tarde a prisão do advogado Antônio Marcos Sartori e do húngaro Ferenc Barko. Os dois foram presos no momento em que recebiam o dinheiro numa sala do 3º andar do Citybank, na esquina das avenidas Ipiranga e São João.
Desde o dia 25 de julho, Kogan vinha falando por telefone com o advogado. No primeiro contato, a exigência foi o pagamento de 400 mil dólares, pois, do contrário, Ferenc, que trabalhara para as empresas de Kogan, entregaria à Justiça do Trabalho documentos importantes revelando ‘fraudes praticadas pelo industrial’. A polícia foi avisada e passou a gravar os telefonemas. Nos últimos contatos, Sartori disse que seu cliente aceitaria cruzados e pediu Cz$ 7,5 milhões, marcando para a entrega o Citybank, onde tem conta.”
Aquela seria a quarta vez que Abraham seria extorquido, com o valor pedido pela dupla sendo o equivalente à cerca de R$ 11,5 milhões nos dias atuais. Na delegacia, Sartori acusou o advogado de realizar transferências ilegais de suas empresas para o exterior e até de estar envolvido com um banqueiro do jogo do bicho, que supostamente ficava encarregado de conseguir a liberação junto a polícia para que as máquinas de videopôquer pudessem ser comercializadas no Rio de Janeiro.
“Nosso ramo são máquinas eletrônicas para fliperamas,” defendeu-se Kogan na época. “Paguei três vezes para chantagistas e resolvi não mais pagar. Cansei de ser extorquido e vou arcar com as consequências. Alguns documentos de minha empresa não estão corretos e reconheço.”
Hoje Abraham Kogan vive em Mônaco.